fevereiro 12, 2012

Semana de Arte Moderna e os Italianos de São Paulo!

Juó Bananére e “Brás, Bexiga e Barra Funda”
Estamos comemorando os 90 Anos da SEMANA DE ARTE MODERNA DE SÃO PAULO (1922/2012). Então, nada mais apropriado do que focarmos a realidade de São Paulo na década que antecedeu ao grande evento e na década seguinte.

E era na revista dirigida por um dos principais organizadores da Semana, Oswaldo de Andrade, que era retratada a sociedade paulistana – com um percentual de 35% de imigrantes ou descendentes de italianos – além, claro, dos imigrantes de outras nacionalidades, que dariam vida aos “arquétipos populares”, como o português da padaria, o espanhol do ferro-velho, o sírio das prestações, o japonês da tinturaria... A revista era “O Pirralho” (1911/1917), onde Oswaldo de Andrade escrevia crônicas do cotidiano com o pseudônimo de Annibale Scipione.

“Migna terra tê parmeras /
 Che ganta inzima o sabiá”...
A italianidade de uma São Paulo em grande transformação urbana foi, com os chamados ítalo-paulistas (interior) e os ítalo-paulistanos (capital), nas primeiras décadas do Século XX, fontes de inspiração para dois jovens escritores do Modernismo no Brasil:
Alexandre Ribeiro Machado, em 1915 (“La Divina Increnca”) que se firmou com pseudônimo de Juó Bananére, e Antônio de Alcântara Machado, em 1927, por seu livro “Brás, Bexiga e Barra Funda”. Ambos se dedicaram a retratar os imigrantes italianos. “Juó Bananére”, apresentado como “poeta, barbieri e soldato”, que escrevia sátiras famosas de obras famosas. A “Canção do Exílio”, por exemplo, de Gonçalves Dias ganha, em uma língua macarrônica, grande popularidade:

MIGNA TERRA
(Juó Bananére)

Migna terra tê parmeras,
Che ganta inzima o sabiá,
As aves che stó aqui,
Tambê tuttos sabi gorgeá.

A abobora celestia tambê,
Chi tê lá na mia terra,
Tê moltos millió di strella
Chi non tê na Ingraterra.

Os rios lá sô maise grandi
Dus rio di tuttas naçó;
I os matto si perdi di vista,
Nu meio da imensidó.

Na migna terra tê parmeras,
Dove ganta a galligna dangolla;
Na migna terra tê o Vapr’elli,
Chi só anda di gartolla.

O personagem Juó Bananére ficou famoso e muito popular, afinal mostrava, com bom humor e criatividade, a aculturação dos imigrantes italianos que se expressavam, tanto na linguagem falada como na escrita, misturando as duas culturas, a italiana e a brasileira. Para esse sucesso, a criação artística do personagem era indispensável. E foi o ilustrador e chargista João Paulo Lemmo Lemmi (1884/1926) – imortalizado como VOLTOLINO ! – que criou a imagem de Juó Bananére. Seria dele, também, as primeiras charges do pai da boneca Emília, Monteiro Lobato, que datam da década de 1910.

O interior também era “una piccola Italia...”

O pesquisador e historiador botucatuense, Trajano Carlos de Figueiredo Pupo (revista “Peabiru”, nº 13/1999), registrou que em 1914, eram grandes a importância das Bandas para as comunidades interioranas e também a movimentação popular a favor da ajuda oficial para essas bandas. E um pequeno jornal,”O Riso”, em 1914,  publica o desabafo de Juó Laranjére, representando a vontade da colônia italiana que era muito expressiva e atuante:

“Signor Preffeto. Salute e figli maschi. Io vegno intó apidi in nomi delle signorini fitêre di facer la bandigna dello Lazigno vegna una altra volta atocá nu giardino uns dumingo. Io credo Signor Preffeto chi si o signor inda anamurasse dava tutos os fiorins da Câmera pra u Lasigno atocá. Má, esta falta di miglioramento é pur causa dus giornale. U “Curreio” é vostro, u “butucatuenze” ta cum mico na caxola purque illo qué una altra volta ristaurá amunarchia nisto Brasile chiinho di Hermeses i di Pigneroses i di Ruyses. U “Curreio Du Sud” é mezimo um cureio só parla di prete frate vescove e tutta a bella compagnia. Ma in tuttos caso noi no abbiamo musica nu giardino. Nu carnavale us moços chiriam afazê uma vacca pra cumpra um rigalegio é i atucá nu giardino. Ma a vacca num dêo lette i si dessi ficava feígno pro Preffeto. Io pido agora pru signore no si azangá perchê nu papele e na tinta inda num chegô a crisi. Di Vostra Excellenza, Criadino. Juó Laranjére.”

E junto com os dois escritores, um antes e o outro durante e após a Semana de Arte Moderna, temos a figura ousada, criativa e brilhante de Oswaldo de Andrade. Assim, ao registrarem o “dialeto macarrônico ítalo-paulista”, tanto Alexandre Ribeiro Machado (Juó Bananére) quanto Antônio de Alcântara Machado, estavam traçando, com perfeição, o perfil dos imigrantes italianos que vieram para o Brasil em busca de seus sonhos e, carregados de esperanças e com muito trabalho, souberam realizar a grandeza da nossa Paulicéia.
Observação: Leiam a Frase da Semana, aqui.

9 comentários:

Delmanto disse...

É com muito orgulho que apresentamos o REGISTRO HISTÓRICO da importância e da influência, culturalmente falando, da então crescente Colônia Italiana na sociedade paulista, no início do século XX.
Nas comemorações dos 90 ANOS DA SEMANA DE ARTE MODERNA não poderíamos deixar de focar aspectos importantes que a antecederam e que se projetaram, ao depois, como resultado dela e da plêiade de intelectuais que dela participara. A “intelligentzia” brasileira ali estava a carimbar com o “selo da brasilidade” a Cultura Brasileira.
Alexandre Ribeiro Machado e Antônio de Alcântara Machado foram dois escritores expoentes que, ligados ao líder e promotor cultural, Oswaldo de Andrade, souberam “retratar” com humor a nova realidade cultural da nossa Paulicéia.
O dialeto “macarrônico ítalo-paulistano” antes de ser uma crítica ao modo de falar e de se expressar dos “oriundi” era, isso sim, um jeito carinhoso, com muito humor e criatividade, que misturava duas culturas, a italiana e a brasileira, deixando para sempre registrado esse sotaque inconfundível em vários partes do Brasil.
E na frase da semana um retrospecto do maior evento cultural do século XX !!!
90 ANOS DA SEMANA DE ARTE MODERNA !!!
“JUÓ BANANÉRE”, na capital e “JUÓ LARANJÉRE”, no interior, mostram bem a presença envolvente, extremamente participante e entusiasta do imigrante italiano que vinha para o Brasile” com a família para construir a sua nova Pátria!

Anônimo disse...

Quando Oswaldo de Andrade dizia que “a massa ainda comerá os biscoitos finos que fabrico”, ele falava de todo o processo da busca de uma identidade nacional, verde/amarela para a nossa cultura. Hoje, na perspectiva do tempo, sabemos como foi difícil, quantas resistência da então elite cultural que dominava a mídia e era poderosa. Então, a importância de Juó Bananére e Juó Laranjére nos mostra como a italianada estava participando de forma efetiva daquele momento cultural. E, muito importante, nos mostra que Oswaldo de Andrade desde a primeira década do século passado já atuava e liderava culturamente falando, o processo criativo no qual, ele próprio, participava com o pseudônimo de Annibale Scipione!
E hoje – 90 Anos depois! – podemos afirmar que “ amassa come, sim, os preciosos biscoitos de Oswaldo de Andrade e come, também, os biscoitos produzidos por aquele grupo ousado e revolucionário que realizou a SEMANA DE ARTE MODERNA.Valeu! Parabéns pelo post!
Prof. Luís ((luisroberto-souza@yahoo.com.br)

Anônimo disse...

A atuação da Colônia Italiana na formação cultural do povo brasileiro precisa de um estudo bem aprofundado. No rico interior do Estado de São Paulo, do Paraná , de Minas Gerais e do Rio Grande do Sul, a contribuição foi muito grande e definitiva. Desde o início do século XX, com os clubes sociais, as Bandas e Orquestras, o Teatro, a Colônia Italiana sempre enriquecia o setor cultural. As comemorações das datas magnas da Itália ajudaram a criar o costume e o entusiasmo dos brasileiros nas comemorações de suas datas cívicas. Como diria Juó Bananére : abastante Preffeto buono...salute Brasile!
(p.gomes@yahoo.com.br)

Delmanto disse...

A referência no texto ao personagem Juó Laranjére, que faz com humor e de forma típica autênticas reivindicações da população às autoridades da época, é mostra indiscutível da influência cultural da Capital nas cidades do interior. O personagem Juó Laranjére foi inspirado no famoso Juó Bananére – popular morador do Bexiga! – criação do poeta e jornalista Alexandre Ribeiro Machado que veio de Pindamonhangaba para estudar engenharia na Escola Politécnica (futura USP). Chegando a São Paulo, notou que era muito expressiva a presença de imigrantes italianos que trouxeram toda a sua alegria e entusiasmo para a nova Pátria... Notou também que tinham grande dificuldade para se fazerem entender em português e, nesse esforço, criaram um inusitado dialeto. Esse personagem criado era “CAV. UFF.ON JUÓ BANANÉRE: poeta, Barbiere i giornaliste, Membaro da Gademia Baulista di Letteras i Sócio da Palestra Intália...”
Em seu vocabulário próprio, Juó Bananére chamava São Paulo de Zan Baolo e a Pátria saudosa passava de Itália para Intália...
Botucatu, como a Capital, possuía nos primeiros anos deste século uma das maiores e mais expressivas colônias italianas do interior, possuindo também o 5º parque industrial (formado principalmente pelos pioneiros imigrantes italianos). Tinha o Teatro Santa Cruz (Espéria), a Società Italiana, a Escola Dante Alighieri, a Loja Maçônica Silvanno Lemmi e, entre outras atividades, a Banda Italiana.
Juó Laranjére, com seu inusitado dialeto, fazia sucesso em Botucatu do início do século passado, e banda virava bandigna, o maestro Lazinho virava Lasigno, tudo isso registrado no “Curreio” (jornal “O Correio de Botucatu”) e no “Butucatuense” (jornal “O Botucatuense”).
É REGISTRO HISTÓRICO!

Anônimo disse...

Olá, Delmanto.
Antonio comentou a notícia Semana de Arte Moderna e os Italianos de São Paulo!.

Comentário:
Bela matéria ! Resgate da cultura italiana que foi tão importante para o que hoje é São Paulo. Não sei porquê mas me lembrei de Anita Malfati.

Abraços,

Antonio Carlos Macedo (Dihitt)

Responda e leia mais no endereço http://www.dihitt.com.br/meu_conteudo#n=semana-de-arte-moderna-e-os-italianos-de-sao-paulo&c=1499311

Delmanto disse...

Excelente a sua lembrança, Antonio Carlos. Click na Frase da Semana e encontrará Anita Mafalti. Obrigado por seu comentário. Grande abraço, Delmanto.

Anônimo disse...

Delmanto:
Fui lá em frases da semana. Muito bom !
Seu blog está no meu rol de necessários.

Um forte abraço,
Antonio Carlos Macedo (Dihitt)

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Anônimo disse...

A mídia está dando o devido destaque para a SEMANA DE ARTE MODERNA de 1922! Participaram da Semana nomes consagrados do modernismo brasileiro, como Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Víctor Brecheret, Plínio Salgado, Anita Malfatti, Menotti Del Pichia, Guilherme de Almeida, Sérgio Milliet, Heitor Villa-Lobos, Tarsila do Amaral, Tácito de Almeida, Di Cavalcanti entre muitos outros. Mas é fundamental que se conheça o antes e o depois dessa Semana Famosa. As influências da Europa e a influência e participação dos imigrantes italianos que estavam construindo São Paulo, com dedicação e entusiasmo. E esse “dialeto itálico-paulistano” foi famoso e fazia sucesso. A resistência inicial da burguesia paulista à presença desses estrangeiros. A postura distante dos chamados Barões do Café e a “miscigenação” ocorrida, principalmente quando os quatrocentões já quase falidos tinham suas filhas ou filhos se casando com os filhos ou filhas de pequenos industriais da capital e do interior. Quem já leu a história do Conde Francesco Matarazzo e o papel de Ciccilo Matarazzo na cultura paulista pode dimensionar a importância dos “oriundi” nas artes e na cultura paulista.
(pinto.rodolfo28@yahoo.com.br)

Anônimo disse...

Impossível deixar de citar dois “ítalo-paulistanos”que foram vetores da cultura paulista: Pietro Maria Bardi e Ciccilo Matarazzo Sobrinho. Do primeiro, como consultor cultural de Assis Chateaubriand, nos foi legado o MASP – Museu de Arte de São Paulo. Do segundo, tivemos as Bienais no Ibirapuera e o MAC – Museu de Arte Contemporânea que agora está instalado no Ibirapuera, no antigo prédio usado pelo Detram mas construído para essa finalidade cultural por Oscar Niemeyer.
(carla.bueno2011@bol.com.br)

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