março 05, 2012

Villa-Lobos e o Nacionalismo Musical









- 5 de março, aniversário de nascimento de
Heitor Villa-Lobos! -

"Quem o viu um dia comandando o coro de 40 000 mil vozes adolescentes, no estádio do Vasco da Gama, não pode esquecê-lo nunca. Era a fúria organizando-se em ritmo, tornando-se melodia e criando a comunhão mais generosa, ardente e purificadora que seria possível conceber"
Carlos Drummond de Andrade


Transformações profundas mudavam o perfil da sociedade brasileira nos primeiros anos da década de 20, nos campos da literatura, da arte e da música: desde a revolucionária SEMANA DE ARTE MODERNA DE 1922 até a nova música que surgia carregada de folclore e brasilidade na maestria criativa de Heitor Villa-Lobos (1887-1959), responsável pela descoberta de uma linguagem peculiarmente brasileira em música, compondo obras que enaltecem o espírito nacionalista, ao qual incorpora elementos das canções folclóricas, populares e indígenas.

Ainda no século XIX, em outra realidade social e cultural, com a predominância da música clássica e das óperas dos grandes mestres, o Brasil já começava a pontuar com muito brilho, através das grandes criações do Maestro Carlos Gomes, considerado o iniciador do nacionalismo musical brasileiro com sua obra, encimada pela ópera “O GUARANI”. Fez sucesso no Teatro Scala de Milão e encantou o mundo com sua genialidade.

Carlos Gomes e Villa-Lobos são os expoentes da musicalidade brasileira. No entanto, ambos sofreram por terem suas ligações com o Poder. O maestro Carlos Gomes por sua ligação histórica com a Monarquia e com o Imperador Dom Pedro II, tendo recebido, sempre, o apoio e o prestígio necessários para que pudesse brilhar e se impor na Europa. O maestro Villa-Lobos por sua vinculação à Ditadura do Estado Novo e ao Ditador Getúlio Vargas.

Os anos de 1930/40 seriam marcados por uma grande atuação na educação. E a participação do maestro Villa-Lobos nos grandes eventos orfeônicos comemorativos das datas cívicas, sempre caracterizou a vinculação dele com o governo totalitário e a associação que se fez entre música, disciplina e civismo.

Em 1931, em São Paulo, o maestro organizou uma concentração orfeônica chamada "Exortação Cívica", com 12 mil vozes. Após dois anos assumiu a direção da Superintendência de Educação Musical e Artística. A partir de então, a maioria de suas composições se voltou para a educação musical. Em 1932, Getúlio Vargas tornou obrigatório o ensino de canto nas escolas e criou o Curso de Pedagogia de Música e Canto. Em 1933, foi organizada a Orquestra Villa-Lobos.
A experiência do Canto Orfeônico no Brasil



No artigo de Ricardo Goldemberg, “Educação Musical: a experiência do canto orfeônico no Brasil”, o autor nos dá uma visão da importância que representou o movimento do canto orfeônico no Brasil, nos anos de 1930/40, sob a orientação de Heitor Villa-Lobos, bem sucedido a princípio, o projeto de disseminação de uma cultural musical através do canto, estagnou e foi praticamente esquecido.

Em 1930, realiza turnê por sessenta e seis cidades. Grande sucesso! Realiza também nesse ano a “Cruzada do Canto Orfeônico" no Rio de Janeiro. Eram tão grandes o sucesso de Villa-Lobos e a aceitação da população que a visita em cada cidade era um fenômeno. Em 1931, a CARAVANA VILLA-LOBOS esteve em Botucatu/SP, quando foi festivamente recepcionada. A foto, defronte ao Teatro Espéria, mostra, ao centro, o maestro Villa-Lobos, com a presença dos professores da Escola Normal (prof.Franklin de Mattos, prof. Sylvio Galvão, profa. Jair Conti), do prefeito municipal, Leônidas Cardoso, autoridades e populares.
Explica o autor que “o ideal do canto orfeônico tem suas raízes na França. No início do século XIX, o canto coletivo era uma atividade obrigatória nas escolas municipais de Paris e o seu desenvolvimento propiciou o aparecimento de grandes concentrações orfeônicas que provocavam o entusiasmo geral. Na época, o sucesso desse empreendimento foi tal que surgiu até mesmo uma imprensa orfeônica
- Charge de Osvaldo/Folha de S. Paulo -

O canto orfeônico tem características próprias que o distinguem do canto coral dos conjuntos eruditos. Trata-se de uma prática da coletividade em que se organizam conjuntos heterogêneos de vozes e tamanho muito variável. Nesses grupos não se exige conhecimento musical ou treinamento vocal dos seus participantes
O método obteve sucesso em outros países, sendo que o autor destaca os seguintes aspectos da realidade brasileira da época: “as conotações de caráter políticos; a falta de capacitação pedagógica adequada, a falta de uma metodologia de ensino suficientemente estruturada”.
Ricardo Goldemberg cita a opinião crítica do professor de História Contemporânea da USP, Arnaldo Contier, que enfoca a questão de forma particularmente rigorosa: "Villa-Lobos esteve na Alemanha nazista, quando voltou de Praga em 36. E, naquele momento, fez uma relação muito clara entre musica, civismo, propaganda e trabalho. Uma atitude nada ingênua e, ao contrário, muito consciente. Villa-Lobos compactuou com o regime getulista de um modo deliberado e o fez porque quis e nunca somente por necessidade."
Mesmo assim, é indiscutível a importância, o esforço e o mérito de Villa-Lobos. À parte o aspecto político, o trabalho que ele fez na divulgação de nosso folclore e das riquezas nacionais é valioso, revolucionário!


PENSAMENTOS DE VILLA-LOBOS:

"A todo o povo assiste o direito de ter, sentir e apreciar a sua arte, oriunda da expressão popular”
"A música, eu a considero, em princípio, como um indispensável alimento da alma humana. Por conseguinte, um elemento e fator imprescindível à educação da juventude."
"O ensino e a prática do canto orfeônico nas escolas impõe-se como uma solução lógica."
"O folclore é hoje considerado uma disciplina fundamental para a educação da infância e para a cultura de um povo."
"Antes do aluno ser atrapalhado com regras, deve familiarizar-se com os sons. Deve-se ensinar-lhe a conhecer os sons, a ouvi-los, a apreciar suas cores e individualidade."
CRONOLOGIA HISTÓRICA DE VILLA-LOBOS:

1887: Nasce no Rio de Janeiro a 5 de Março. –
1897: Aprende violoncelo com o pai. –
1903: Aperfeiçoa a técnica de violoncelo com Breno Niemberg. –
1905: Começo de uma vida errante pelo Brasil de Norte a Sul, que durará 8 anos. –
1907: Curta passagem pelo Instituto Nacional de Música do Rio de Janeiro, tendo aulas de Harmonia com Frederico Nascimento.
1913: Fixa-se no Rio de Janeiro. Ganha a vida a tocar em teatros de revista e de opereta. –
1915: Realiza o primeiro concerto de obras suas, dando início ao modernismo brasileiro. –
1918: Acaba a ópera Izaht. –
1919: Apresenta o Quarteto Op. 15 em Buenos Aires. Compõe a suite para piano Prole do bebé. –
1922: A Semana da Arte Moderna de São Paulo consagra-o como compositor.
1923: Viagem à Europa. Paris passa a ser a sua segunda cidade. –
1924: Consagração em Paris. O pianista Arthur Rubinstein interpreta Prole do bebé. –
1926: Realiza três festivais sinfonicos para a Associação Wagneriana de Buenos Aires. –
1927: Volta à Europa. Dirige obras suas à frente das mais prestigiadas orquestras européias. Em Lisboa dirige a Sinfonica portuguesa. É professor de composição do Conservatório Internacional de Paris e faz parte do Comité d’Honneur. –
1930: Regressa ao Brasil. Compõe os Choros. Apresenta programa educacional. Dá concertos em S. Paulo. Compõe as Bachianas Brasileiras. –
1932: É nomeado para dirigir a Superintendência da Educação Musical e Artística. –
 1936: Casa com a jovem cantora Arminda Neves de Almeida. –
1937: É membro honorário da Academia de Santa Cecília de Roma. –
1942: Dirige o Conservatório Nacional de Canto Orfeônico. Cria a sua própria orquestra sinfonica. –
1943: É nomeado Doutor em Música Honoris Causa pela Universidade de Nova Iorque e também pela Universidade de Los Angeles. –
1945: Fundador e presidente da Academia Brasileira de Música. –
1947: Ganha o prêmio do Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura.
1948: A sua ópera Malazarte é estreada nos Estados Unidos. –
1954: Visita Israel a convite do governo de Tel-Aviv de que resulta a obra A odisséia de uma raça.
1959: Morre no Rio de Janeiro a 17 Novembro
( fonte: Leonor Lains/ Vidaslusofonas)




6 comentários:

Anônimo disse...

Os maestros Carlos Gomes e Villa-Lobos foram protegidos, o primeiro pela Monarquia e pelo Imperador Dom Pedro II, e o segundo pela Ditadura de Getúlio Vargas. Mas a história da humanidade e, principalmente, das artes e da cultura, nos mostra os grandes mestres como Leonardo Da Vinci, Mozart, Miquelangelo também sendo patrocinados por casas reais e pela Igreja. O Mecenato não vincula o artista a seu protetor. Para a posteridade, ficam só as grandes obras e seus autores! É a vida...
(carla.bueno2011@bol.com.br)

Anônimo disse...

Após a Proclamação da República, o consagrado maestro Carlos Gomes foi colocado na “geladeira” pelo governo republicano. Nunca mais recebeu qualquer tipo de apoio. E o maestro Villa-Lobos também pagou um alto preço por sua vinculação à ditadura. À partir de 1945, ele pasou a ser visto como um “assecla”, mero “propagandista” do governo autoritário. Só recentemente ele passou a ser considerado pelos críticos e tem tido suas obras divulgadas. Não se pode esquecer que Villa-Lobos já havia mostrado seu talento na Semana de Arte Moderna de 1922, em São Paulo, a Ditadura do Estado Novo veio bem depois...(haroldo.leao@hotmail.com)

Anônimo disse...

O presidente Getúlio Vargas soube ver a genialidade de Villa-Lobos e soube aproveitá-la. Está certo ele. Imagine um evento cívico com 40.00 mil vozes, além de ser magnífico e fazer sucesso, dava espaço para o discurso do presidente gordinho, baixinho, sorridente e bonzinho...rsrsrs E o povão gostava. Não se deve esquecer que desde o Império Romano é preciso dar “pão e circo” para “amaciar” a pobreza do povão. E o maestro Villa-Lobos soube aproveitar essa oportunidade e realizou grandes eventos. Valeu! (bastosgustavo@yahoo.com.br)

Anônimo disse...

Olá, prezado Armando!
Bom dia!
Gostei muito desta edição do seu blog, abordando o vulto fabuloso de Villa Lobos. Um abraço da Maria Amélia (ameliapiza@uol.com.br)

Anônimo disse...

Na minha época de grupo escolar (faz tempo, heim?) era ensinada a matéria de Canto Orfeônico, nas primeiras séries do ginásio. Mas para a turma dos menores, do básico, tinha o canto obrigatório dos hinos da independência e da bandeira. Era uma festa, todos em fila cantando o hino nacional. Criar “versões” para as letras dos hinos era a grande disputa entre nós. Tempo alegre e bom, já começava com cantoria, não poderia terminar de modo ruim. Seria o caso de retornar o ensino de música. Mas com professores bem preparados e com boa pedagogia para entusiasmar os alunos, sem assustá-los com aquele pêndulo que marcava o ritmo e que parecia algo do outro mundo...
(mariceiaoliveira@yahoo.com.br)

Anônimo disse...

Villa-Lobos apresentou uma série de 3 espetáculos na SEMANA DE ARTE MODERNA DE 1922, nos dias 13, 15 e 17 de fevereiro) sendo que foi a sua “estréia” em um palco (Teatro Municipal de São Paulo) tão erudito e clássico. Além do Maestro Villa Lobos, Guiomar Novaes interpretou obras de Debussy e Ernani Braga interpretou “A Fiandeira” do próprio Villa-Lobos.
São Paulo tem orgulho de ter abrigado tão importante evento cultural, carregado de nacionalismo cultural e tendo como participantes os intelectuais e artistas plásticos que iriam marcar a cultura brasileira nos anos seguintes. Muito bom!
(jair.castro66@yahoo.com.br)

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